CONFIRMA PARA A PRAIA DO ITAMAMBUCA O CAMPEONATO NACIONAL DE SURFE FEMININO 2017
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Silvana Lima, única brasileira na elite do surfe competitivo,
vence etapa da divisão de acesso do circuito mundial em Los Cabos, no
México, em junho passado
Crédito:
Andrew Nichols / WSL
Disfarçada de notícia boa, era, no fundo, uma notícia triste.
“A Praia de Itamambuca, Ubatuba (SP), será palco para a apresentação das
principais surfistas do país entre os dias 22 a 24 de setembro.
‘Estamos muito felizes em anunciar que o evento está confirmado’, disse o
surfista Wiggolly Dantas.”
A competição anual, organizada pelo atleta,
serviu para eleger a campeã brasileira de surf feminino nos últimos dois
anos. Porque, bem, não existe um campeonato brasileiro de surf
feminino. Na verdade (e eis notícia triste), atualmente não existe
nenhuma outra competição de surf feminino profissional no país – por
isso o torneio de Wiggolly acabou virando o “brasileirão” da categoria. A
consequência óbvia do marasmo de campeonatos é que o Brasil deixou de
revelar surfistas mulheres para o circuito mundial. Desde 2013, quando a
catarinense Jacqueline Silva se aposentou da elite competitiva, a única
representante brasileira permanente na World Surf League (WSL) é a
cearense Silvana Lima, 32. “Quando comecei a carreira, em 2002, existiam
os circuitos femininos da Petrobras e do Supersurf. Eram oito eventos
para mulheres todo ano no Brasil”, ela se recorda. “Isso fora os
campeonatos amadores, que, naquela época, davam até carro de premiação.
Era bem diferente de hoje.”
Silvana conta que, após
se mudar para o Rio de Janeiro para tentar viver como surfista, ela
passou dois anos sem patrocinadores. Eram os prêmios dos campeonatos que
pagavam as contas e permitiam a ela seguir como atleta – a cearense de
Paracuru seria duas vezes vice-campeã mundial (2008 e 2009) e se
consolidaria como a melhor competidora brasileira na história da WSL.
Hoje, ela confessa, às vezes se sente meio solitária no circuito. “Não
ter uma companheira brasileira que me dê um suporte, que uma puxe o
ritmo da outra, é ruim. Poderia existir uma nova geração que estivesse
comigo. Mas faltam as competições.”
É
uma pena, mesmo – e não apenas pela solidão de Silvana. Mas porque,
enquanto o Brasil assiste de fora, o campeonato mundial de surfe
feminino atravessa um momento glorioso. Uma nova e talentosa geração –
as australianas Tayler Wright (23 anos) e Sally Fitzgobbons (26), as
americanas Lakey Peterson (22) e Curtney Conlogue (24) – elevou as
baterias a um patamar técnico inédito. “As mulheres, nos anos recentes,
retornaram o investimento [dos organizadoresda liga mundial]
ao apresentar o melhor surf jamais visto na categoria e produzir as
mais empolgantes disputas por títulos da história do esporte”, afirma a
direção da WLS, em nota, à Tpm. E essa evolução se traduziu em números.
Em
2012, a premiação do circuito masculino era de US$ 425 mil por etapa.
Existiam 36 surfistas na disputa, portanto a WSL pagava em média US$
11,8 mil por atleta a cada evento do tour. A situação das mulheres era
diferente. A premiação era de US$ 110 mil por etapa, o que significava
US$ 6,1 mil a cada uma das 18 competidoras – mais ou menos metade do
prêmio dos homens. Cinco anos depois, o fosso da diferença se fechou. Em
2017, a premiação per capita será rigorosamente a mesma: 16
mil dólares por etapa, seja para homens ou mulheres. Silvana Lima, a
atual 14ª colocada do ranking, faturou US$ 51,5 mil em prêmios no ano –
foram cinco etapas até agora. “Além da paridade financeira, a qualidade
dos eventos é um fator muito importante”, afirma a WSL. “Em 2014, nós
acrescentamos Fiji, Trestles (Califórnia) e Maui (Havaí) ao calendário
feminino e, neste ano, Hossegor (França), para que elas também possam
pegar as melhores ondas.”
Se a distância entre
homens e mulheres minguou no cenário global, a fenda entre as
brasileiras e as surfistas do resto do mundo se transformou em um
abismo. “O nível técnico das sul-americanas, em geral, está muito aquém
daquele das tops mundiais. As atletas estrangeiras fazem manobras que
anos atrás somente os homens faziam, enquanto as daqui surfam como uma
década atrás, dando batidinhas e rasgadinhas na onda”, avalia um
brasileiro que trabalha há anos para a WSL. “Para existir atleta, tem
que existir competição”, ele diz.
Competição,
bem, não há. Para uma pequena turma de sortudas, no entanto, surgiu uma
nova forma de viver do surf. Com audiência relevante fora do “público
do surf”, o Canal Off, do grupo Globosat, criou um novo modelo de
negócios para quem sonha em se sustentar por meio do esporte. Ele é
baseado na equação: surfistas que têm espaço no canal (cujo portal na
internet, sozinho, tem quase um milhão de páginas visitadas por mês)
conseguem amarrar patrocínios pessoais graúdos, ainda que não se
destaquem nas competições. A cada ano, a programação tem se aberto mais
ao surf feminino. Em 2017, o espaço dedicado a mulheres surfistas tem
atrações como Por elas, Colônia de férias e Tatiana Weston-Webb, além de 9 pés, co-estrelado pela carioca Chloé Calmon.
Chloé,
22 anos, vive as duas possibilidades ao mesmo tempo. Ela é a atual
líder do campeonato mundial de longboard, categoria na qual as
premiações não chegam a um terço daquelas pagas nos eventos de
“pranchinha”. Carismática e articulada, ela também emplacou a série no
Off, atualmente na segunda temporada. Apesar do sucesso, a jovem revela
outro sintoma da falta que as competições fazem no país. “A Chloé sempre
foi mais conhecida no exterior do que aqui, por causa dos campeonatos
fora”, diz Miguel Calmon, pai e gerente da carreira da surfista. Talvez
isso tenha mudado após o programa no Off, ele reconhece. “Mas, mesmo com
esse espaço, ela ainda vive mais do surf competitivo, financeiramente
falando”, afirma Miguel. “O Off ajuda mais a manter os patrocínios.”
O modelo de “viver da
televisão”, para Silvana Lima, tem dois problemas. “Primeiro, é para
poucas, né?”, ela alfineta. “Além disso, o que forma talento são as
competições”, diz a atleta. O pai de Chloé concorda. “Pegar onda
perfeita e sem pressão [como nos programas da TV], mesmo eu,
com 60 anos, não faria feio”, ele brinca, enquanto defende que o país
tenha mais campeonatos, fazendo coro a Silvana. “Hoje, estou tranquila,
não posso reclamar. Tenho cinco patrocinadores e uma carreira
consolidada”, ela diz. “Mas e o surf feminino de alto nível no país, vai
acabar? Quando um patrocinador vem me perguntar se estou precisando de
alguma coisa, se tenho algum pedido, respondo sempre a mesma coisa”, ela
conta. “Façam eventos.”
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